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Opinião, de Mãe Stella de Oxóssi — Parte 01

Mãe Stella de Oxóssi
Foto: Iraildes Mascarenhas | Arte: Mirdad


"Quando aponto um dedo para o outro, eu tenho quatro apontados para mim"


"Jorge Amado, ateu que acreditava em Oxossi (...) foi escolhido como Oba de Xangô no Ile Axé Opo Afonjá. Ele foi para nós um Sacerdote 'Ministro da Justiça', que atuou de maneira marcante, uma vez que foi através dele que o Candomblé passou a ser constitucionalmente visto como uma religião, o que fez com que seus adeptos não precisassem mais pedir licença à polícia para adorar Olorum – o Grande Criador – e os Orixás – as divindades auxiliares. Filho espiritual da saudosa Mãe Senhora, o deputado Jorge Amado, através de Osvaldo Aranha, entrou em contato com o então Presidente da República – Getúlio Vargas – que instituiu o decreto 1212, dando liberdade de culto ao conhecido 'povo de santo'. Xangô, orixá da justiça, que tem no número 12 uma forte simbologia, com certeza estava ao lado de Seu ministro"


"Muitas tradições só consideram que o homem é dono de si quando adquire controle sobre sua língua"


"Toda comunidade possui um bobo. Afinal, as verdades ditas por ele servem para que a autoridade máxima possa ser criticada e assim não se perca, por vaidade e orgulho, na utilização do poder que lhe foi conferido"


"Nunca imaginaria que se fala da vida alheia apenas pelo fato de não encontrar na própria vida temas interessantes o suficiente para serem dignos de registro, fazendo com que busque preencher o vazio de sua existência com emoções ainda mais vazias"


"Em primeiro lugar, ninguém deve afirmar nada para o outro, pois cada um tem sua verdade. Em segundo, penso que se todos creem em uma mesma coisa, com certeza é porque ela deve existir"


"Um amor recheado de cumplicidade (...) que tinha poder e intimidade suficientes para fazer com que a troca de olhares falasse tanto quanto as palavras pronunciadas pela boca; um amor que todos buscam, mas que não necessariamente se preparam para encontrar, e que quando encontram dificilmente conseguem conservar"


"Foram tantas as perguntas ridículas, acompanhadas de respostas ainda mais ridículas, que foram embora todas as minhas certezas (para meu grande alívio, ufa!)"


"Impossível compreender o outro se não nos dispusermos a escutá-lo (...) Para escutar verdadeiramente o outro, a atenção precisa estar concentrada, o coração livre de preconceitos e a alma aberta para generosidade (...) Para que o outro realmente nos escute, é preciso que exista em nosso íntimo um real desejo de sermos compreendidos. Falar com o peito aberto, sem rodeios, sem receio de sermos mal interpretados, colocando as armas de defesa de lado, é fundamental. O silêncio é imprescindível para que se compreenda a comunicação do outro, mas é extremamente prejudicial quando se deseja ser compreendido. É terrível quando alguém acha que o outro tem obrigação de adivinhar seus sentimentos, sem que eles sejam expressos"


"Grande parte dos que me procuram sente-se vítima de inveja. Engraçado é que nunca, nem um só dia sequer, alguém chegou pedindo-me ajuda para se libertar da inveja que sentia dos outros. Será que só existem invejados? Onde estarão os invejosos? E o pior é que quando consulto o oráculo e ele me diz que os problemas apresentados não são decorrentes da inveja, a pessoa fica enfurecida. Percebo logo que existe ali uma profunda insegurança, que gera uma necessidade de autovalorização (...) o problema é que esse comportamento é uma constante"


"Nada adianta ficarmos relembrando o passado com saudosismo. É impossível pararmos a marcha do tempo. O melhor é respeitarmos o seu caminhar e nos adaptarmos a ele"


"Os jogos competitivos são manifestações de um instinto natural e necessário, que abriga outro – a agressividade – também essencial, mas extremamente perigoso. A bola é a mais simples e uma das mais importantes invenções do homem por permitir que essas duas tendências da natureza humana possam ser reveladas, trabalhadas e controladas"



Trechos presentes no livro de crônicas "Opinião" (2012), de Mãe Stella de Oxóssi.

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